Dois dos patriotas cubanos, Antonio Guerrero e Gerardo Hernández, exibem sua arte no Reino Unido – apesar de estarem encarcerados nos Estados Unidos – em uma mostra que extrapola a estética contemporânea e levanta questões políticas ainda insolúveis
Por Christiane Marcondes*
Por quien merece amor, de Antonio Guerrero - detalhe
Presos injustamente em abril de 2001, em Miami, eles estavam infiltrados em grupos terroristas anticastristas da Flórida, tentando impedir atos de sabotagem política em Cuba. Em um deles, hotéis de Havana foram incendiados nos anos 1990, prejudicando a indústria turística que experimentava um momento de alta.
Os cubanos foram condenados a penas que vão desde 15 anos a prisão perpétua sob a acusação de que estavam atuando nos Estados Unidos a serviço de uma potência estrangeira.
Os advogados dos cinco patriotas argumentaram, sem êxito, que um julgamento justo seria impossível no ambiente tóxico e anticastrista que predomina em Miami. Em 2011, um dos cinco, René González, saiu da prisão, mas está sendo mantido em liberdade condicional na Flórida.
Experimentalismo
A exposição de arte Além da imagem, que será inaugurada em Glasgow em maio, mostrará o trabalho de 26 dos mais conhecidos artistas cubanos e de outros 20 nomes estrangeiros que doaram suas obras para chamar atenção sobre o caso. É a maior coleção de artistas cubanos já apresentada no Reino Unido.
“A arte de Cuba é muito surpreendente”, disse Dodie Weppler, especialista em arte cubana e coordenadora da exposição: “A cultura sempre foi um fator essencial na tradição cubana de origem e, com a Revolução, tornou-se possível levar a arte a um grau de experimentação em escala nunca vista nas Américas”.
Entre os artistas expositores cubanos - como “Kcho”, Manuel Mendive, “Choco”, José Fuster, Juan Roberto Diago – alguns são mundialmente reconhecidos.
Outros artistas, a maioria do Reino Unido, doaram seus trabalhos para apoiar a mostra, entre eles estão John Keane, Mona Hatoum, Alasdair Gray, Derek Boshier, John Byrne, David Harding, o coletivo kennardphillipps o cartunista do The Guardian, Steve Bell.
Arte e liberdade
Antonio Guerrero aprendeu a desenhar e pintar na prisão emFlorence, Colorado, com ajuda de um companheiro de cela, um artista afro-americano. Guerrero trabalha com aquarela e pastel, explorando temas como aves exóticas e borboletas. Escreveu que por meio da arte “tem vencido a prisão”. Hernández já era cartunista amador antes de ser preso e fazer caricaturas se tornou a sua especialidade no campo artístico.
A arte era originalmente vista como elemento chave da revolução cubana. Existem ainda 14 escolas de arte na ilha e uma universidade de artes plásticas em Havana. De acordo com René Duquesne, do Conselho de artes Visuais de Cuba, há 13 mil artistas registrados na instituição. “Com este número, não há número suficiente de galerias para atender à demanda e a maioria dos materiais precisa ser importada”, declara.
“O bloqueio estadunidense provoca enormes dificuldades para as pessoas que querem viver da arte, porque elas não recebem salário, a não ser que consigam se colocar no mercado como designers, professores ou em áreas relacionadas. Do contrário, só lhes resta vender a obra e, para isso, são forçados a buscar saídas fora de Cuba”.
Arte e investimento
Weppler garante que a reputação da arte cubana vem crescendo de modo constante, conforme demonstrou um artigo do the Wall Street Journal, de quatro anos atrás. Apesar de o veículo não estar entre os que admiram o governo da ilha, o texto identificou “Cuba como o centro mais atrativo da arte” para investidores.
Os Estados Unidos, no entanto, mantêm o bloqueio contra Cuba e a proibição quase total de que os estadunidenses visitem a ilha, mesmo com o ligeiro afrouxamento das restrições durante o governo Obama.
“Batizamos a exposição de Além da imagem porque propomos uma ruptura com a tradição da estrutura como um limite e reconhecemos que os cinco patriotas foram enquadrados, como num frame, pelo governo dos Estados Unidos, estão presos nesse instantâneo do tempo”, disse Weppler, que organizou esta mostra em parceria com a Campanha de Solidariedade a Cuba, na esperança de atrair a atenção mundial para o caso dos cinco cubanos – uma causa urgente na ilha – bem como para a arte dessa população caribenha.
“Eu não sabia muito sobre os cinco patriotas”, declarou Keane, artista que denunciou a guerra do Golfo em 1991. “porém acredito no uso da arte para acelerar o curso da justiça. Se a arte pode proporcionar algum tipo de consciência, esse papel lhe cai melhor do que se transformar simplesmente em moeda de valor para pessoas muito ricas”.
Boshier, artista britânico que vive em Los Angeles, disse que a primeira obra que assinou estava vinculada à ilha”. Foi realizada em 1961 e tinha como título “A situação em Cuba”: “Foi uma reação à Baía dos Porcos (uma fracassada invasão de exilados cubanos comandada pelos Estados Unidos). Sua contribuição com a exposição atual é uma reconstrução desse trabalho, porém sob a perspectiva de 2011.
*Para o Vermelho, com informações do The Guardian
Serviço:Além da imagem - Arte Cubana Contemporânea
Galllery El Faro, Glasgow, de 7 a 13 de maio.
Fonte: P. Vermelho
0 comentários:
Postar um comentário